quinta-feira, agosto 21, 2008

Porque os artistas estão mudos?

Essa pergunta me tomou de assalto desde que presenciei a performance "Multidão Zero", na Galeria Vermelho, em São Paulo.1 O trabalho consistia na invasão do espaço da galeria por um grupo de prováveis trinta pessoas, fazendo barulho e com faixas e cartazes em branco. Sem nada a dizer e sem nada reivindicar, os "protestantes" nos encaram para depois se dispersarem na rua. 2

Segundo o programa da Galeria, o trabalho faz uma contraposição das manifestações de protesto dos anos 60 com o "individualismo alienante e a desmobilização social"3 reinante hoje. Porém, não há uma problematização estética da questão, visto que os participantes entram de forma organizada, exibem seus cartazes em branco e retiram-se também de forma organizada, sob uma fumaça vermelha que sai de duas latas colocadas entre eles e o público. Ora, se a intenção é questionar um problema político hoje, a saber: a desmobilização social, também os participantes da marcha zero se apresentam de forma passiva sobre o problema. Mudos, sem expressar opinião e sem verborragia, entram e saem sem estabelecer uma reflexão maior sobre o tema, e ainda poluem o ambiente com uma fétida fumaça.

São diversos os problemas em que estão estabelecidas as sociedades no dia-a-dia, e no entanto, os artistas dificilmente oferecem alguma questão relevante no processo político, social, econômico ou estético. A maioria dos trabalhos são ineficientes em proposições concretas de alternativas à vida.

Essa constatação não deve ser surpresa, pois não é uma regra que a arte deva exercer uma função intelectual de reflexão sobre as ambiguidades e possíveis soluções e alternativas na vida. A arte muitas vezes é superfície e fruição e, para poucos gênios, a hstória já registrou milhares de outros trabalhos irrelevantes.

Não me agradam os trabalhos que sejam totalmente entreterimento. Para mim, é mais instigador quando percebo pelo menos alguma pesquisa ou alguma conexão e/ou sentido para a vida das pessoas, alguma proposição ou reflexão afirmativa e/ou ativa. Que o objeto artístico possa ser honesto e oferecer contribuição a vida dos indivíduos e das sociedades, e que a constatação de que a arte é também vapor não excluí a possibilidade de ser fazer uma arte política no presente, ao contrário, "a Arte revolucionária dever ser uma mágica, capaz de enfeitiçar o homem a tal ponto que ele não mais suporte viver nesta realidade absurda". 4

1- rua minas gerais, 350 - SP
2 - vide foto de 19 de julho de 2008
3 - descrição no programa do Festival Verbo
4 - Glauber Rocha